quinta-feira, 25 de junho de 2009

Viver, lembrar e viver a lembrança.

Texto publicado no Diário da Manhã em maio.

Intercâmbio é algo muito legal. Abrem-se as portas de novas culturas, hábitos e costumes. O que antes era comum agora não é mais, o que era rotina vira exceção e o que um dia foi abundante agora é escasso. É um novo mundo repleto de novidades.

Geralmente, as experiências que se apresentam estonteiam o viajante. Fazem com que ele esqueça, momentaneamente, de onde veio. As novas comidas típicas, bebidas, músicas e pessoas; todos são territórios hostis prontos para serem desbravados. As horas passam, os dias se vão e as semanas se perdem em meio a tanta euforia. Arrisco-me a dizer, ainda, que em Londres essa variedade de tentações até então inexploradas é ainda maior. Afinal de contas, é o meio do mundo. É onde tudo acontece e para onde todos querem vir.

No entanto, com o passar dos meses, o viajante volta a si. Percebe que se esbaldou de tal forma que talvez tenha perdido sua identidade. Enxerga-se no espelho de uma maneira diferente. Mais vivido, mais experiente. Mas é ainda o mesmo?

É nesse momento que bate uma necessidade avassaladora de readquirir os hábitos de sua pátria-mãe. Em uma mescla de orgulho e nostalgia, o viajante faz todo o possível para deixar bem claro uma mensagem implícita: estou aqui, mas sou de lá, e pretendo um dia voltar.

De repente, ver um gringo de Havaianas ganha um significado imenso, encontrar um disco do Caetano Veloso nas lojas recebe um destaque incrível e ouvir pessoas falando português no metrô passa a ser extremamente reconfortante. Qualquer roupa, comida ou bebida proveniente da terrinha passa a trazer consigo um poder enorme: o de fazer com que o viajante se sinta mais perto de casa.

Na ausência dos familiares e amigos, o viajante se apega àquilo que remete à realidade do local em que sempre vivemos. Àquelas coisas que fazem lembrar épocas distantes, acontecimentos específicos e encontros inesquecíveis. A saudade dá as caras de uma forma jamais imaginada. Ela não mede tempo nem intensidade. Apresenta-se em um rebuliço que engloba infância, colégio e faculdade. Confunde o viajante, fazendo com que deseje profundamente ter uma máquina do tempo. Faz com que o presente não pareça tão brilhante e que o passado alcance o posto de insuperável perante a árdua tarefa de “aproveitar a vida”.

Mas é nessa hora que surge outro fator importante: o bom-senso. Se hoje sinto falta do que já fui, amanhã sentirei falta do quê? A resposta é simples: daquilo que estou vivendo agora. E assim sempre será. A missão, portanto, é fazer do dia de hoje um dia sempre melhor, que supere o anterior.

Lembrar é bom e sentir falta é ainda melhor. Não é judiação, é realidade. Um homem que não tem do que lembrar é um homem que não viveu. Sentir falta é saber que, em algum momento do passado, fizemos algo que valeu a pena. Algo que foi satisfatório o suficiente para se tornar inesquecível.

Portanto, o importante é viver, mas sempre lembrando. Lembrando daquilo que já fomos, daquilo que já vivemos. E mais importante que isso, lembrando que, se vivermos ao máximo o dia de hoje, estaremos acrescentando mais um acontecimento à lista dos fatos dignos de lembrança.

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