quinta-feira, 11 de junho de 2009

Um povo sem unidade, mas único

Os olhos puxados dos chineses, o charme das francesas e a burca das muçulmanas. O sotaque dos latinos, o cabelo loiro das suecas e o físico vigoroso dos alemães. O cabelo espetado dos japoneses, a pele morena dos indianos e o jeito desleixado dos argentinos.

Em Londres se convive diariamente com estereótipos, e em grande variedade. Depois de viver algum tempo por aqui, fica mais fácil reconhecer a origem das pessoas. Nacionalidade, religião e cultura: são características que passam a ser vistas a olho nu.
Muitas vezes o intercâmbio cultural sequer existe, e nesses momentos essa classificação fica ainda mais simples. São as festas voltadas para os latinos, os pubs irlandeses e as noites de karaokê dos japoneses. O que era para ser intercultural se transforma em algo exclusivo de cada povo.
O momento de maior interação entre as diferentes culturas acaba sendo na própria sala de aula. Os professores, inclusive, estimulam isso. Formam duplas de trabalho estritamente internacionais.
E foi na sala de aula que pensei pela primeira vez em uma situação que até agora indago: o que caracteriza o brasileiro para um estrangeiro? Como ele sabe que somos brasileiros? Ele sabe? Qual é nossa principal característica? Tal característica realmente existe?

Sinceramente, não sei.

Eu mesmo nunca me passo por brasileiro, mas sim por espanhol e, infelizmente, argentino. No início me chateava a respeito, mas aos poucos percebo que não posso culpá-los. Somos o quinto maior país do mundo tanto em extensão territorial quanto em população, fazemos fronteira com dez países da América Latina e sentimos, até hoje, os reflexos da mescla cultural obtida desde os tempos de colonização.
Não penso que representamos um país sem identidade, muito pelo contrário. Todos nos conhecem, sabem do que gostamos e o que fazemos. Futebol, Rio de Janeiro, carnaval, praia e havaianas. Ao descobrirem que sou brasileiro, são sempre estes os tópicos mencionados pelos gringos. Há também a parte da pobreza, das favelas, do tráfico e do submundo, mas isso é assunto para outra oportunidade.
Voltando ao papo de uma ‘identidade’ nacional, tentei dissecar o fato aos poucos. Pensei então na beleza da mulher brasileira, mas fiquei ainda mais confuso. Gisele Bündchen, Juliana Paes, Fernanda Lima e Alessandra Ambrósio. São todas lindas, mas há algo em comum entre elas? Loiras, morenas, mulatas, magras, olhos verdes, castanhos ou azuis. Não há unidade na beleza da brasileira. Enquanto as francesas são charmosas e as tchecas misteriosas, as nossas mulheres são o quê?
Insatisfeito, cheguei ao futebol, afinal de contas somos exportadores de craques e os únicos pentacampeões do mundo. Mas há unidade nisso? Ronaldo Nazário é atacante, Ronaldinho Gaúcho é meia e Kaká é armador. Já a Argentina é famosa pelos seus goleiros e a Alemanha por seus zagueiros, e nós? Uma vez mais não temos uma característica única e específica. Simplesmente temos ótimos jogadores.
Quem sabe, então, nosso sotaque nos denuncia? Duvido. Penso na dificuldade que tenho para entender baianos e nordestinos em nossa própria língua e essa teoria já se desfaz por terra. Até porque eles também devem sentir a mesma dificuldade para me entender.
Ainda não sei a razão para isso, mas sempre que vejo um brasileiro, percebo na hora. Não sei se é o jeito de andar, o modo de se vestir ou a irreverência de ser. A verdade é que, entre nós, nos conhecemos. Sabemos que viemos do mesmo país, independente do estado. Há algo intangível, uma espécie de aura invisível que nos diz: somos do mesmo lugar. Parece mentira, mas realmente acontece, é como um radar. Concluo, portanto, que há sim algo que nos identifica, pelo menos entre nós. Mas sigo sem saber exatamente o que.

Penso que, talvez, seja exatamente isso que nos diferencia: a ausência de algo em comum, a escassez de estereótipos. Ou melhor, escassez apenas em um cenário universal, pois nacionalmente falando, são inúmeros os exemplos. O carioca sempre vai ser folgado, o mineiro quieto e o gaúcho orgulhoso. A questão é que somos tão diferentes entre nós mesmos, que nos tornamos únicos.

E aí está, portanto, a resposta do problema.

São as nossas diferenças que nos tornam únicos. O que nos diferencia é justamente aquilo que nos dá unidade.

Por isso afirmo: somos um povo sem unidade, mas somos únicos.

10 comentários:

  1. Muito bom querido, é isso mesmo.
    São pelas diferenças que tornam as pessoas únicas e que acaba as tornando especiais!!
    Beijocas

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  2. Show de bola mano!
    Segue que tá afú!
    É nói

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  3. Oi Tomás!
    Ótimo o texto e a idéia de publicares as colunas por aqui.
    Vou acompanhar sempre, pois amo Londres e mato um pouco das saudades.
    Abraços

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  4. na minha concepção acho melhor ser confundido com argentino do que com baiano haha.
    e o show do Oasis tá quase, não?
    visitarei mais vezes, visto que diário da manhã em poa é meio inviável :*

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  5. vamos aplicar esse teu texto na nossa panela: eu, cadija e fernandinha?! só o branco dos olhos né... tu, costa e julinho?! talvez o formato da unha... e eu poderias trocar os nomes umas 5 vezes sem achar semelhanças entre fisicas entre nós. então imagina misturando todo um país, realmente, unidade não é uma caracteristica dos brasileiros.
    ótimo texto tomas, como sempre está impecavel!
    beijos

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  6. fiquei de boca aberta aqui! não sabia que tu ia escrevia tão bem! ;)

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  7. parênteses Ju, sou turca.
    aaahuahuhauhuahuauhahua

    ótimo texto!!!

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  8. sabe aquela cara que a gente faz quando pensa "bah, o cara se deu...". pois é essa mesmo que eu to fazendo. hehe
    e nós brasileiros ja acostumados com as diferenças culturais entre estados e regiões, quando fora do país sabemos conviver com as enormes diferenças entre as demais culturas estrangeiras. nãi digo isso por experiência própria (neh), mas por aprender com vcs aí. ja as outras nacionalidades, citadas por ti, p´recisam de um sentimento que as façam sentir-se em casa, um sentimento que as deixe mais confortáveis. por isso os agrupamentos sem aura, apenas por semelhanças físicas, de sotaque ou sei la mais o que.
    parabenzi pelo texto!
    bjao tomázi!

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  9. tá no sangue mesmo! acho que nem precisa cursar jornalismo! o texto tá muito bom. segue atualizando que público não vai faltar! gostei mesmo da análise. estou no aguardo da próxima postagem!
    abraço

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  10. Este comentário foi removido pelo autor.

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